(Comentário do 2º tópico da Lição 05: A Alma – A natureza imaterial do ser humano)
Ev. WELIANO PIRES
Neste segundo tópico, trataremos
da natureza da alma, destacando sua imaterialidade e imortalidade.
Inicialmente, com base em Mateus 10.28, analisaremos a distinção entre a
substância material e a imaterial do ser humano. Em seguida, abordaremos a
imaterialidade da alma e a responsabilidade pessoal de cada indivíduo, em
contraposição às concepções antropológicas — antigas e modernas — que negam a
responsabilidade moral do homem. Por fim, discutiremos as correntes teológicas
influenciadas pelo marxismo, como a Teologia da Libertação e a Teologia
da Missão Integral, que reduzem o Evangelho a questões socioeconômicas e
ignoram a necessidade do arrependimento.
1. Distinção de substâncias
O texto de Mateus 10.28 apresenta
fundamentos para compreendermos a natureza imaterial da alma:
“E não temais os que matam o
corpo e não podem matar a alma; temei, antes, aquele que pode fazer perecer no
inferno a alma e o corpo” (Mt 10.28, ARA).
A primeira verdade que este
versículo ensina é a distinção entre a parte material e a imaterial
do ser humano — o corpo, como elemento material, e a alma e o espírito, como
elementos imateriais. Embora alma e espírito não sejam exatamente a mesma
coisa, são inseparáveis, e a Escritura utiliza ambos os termos de forma
intercambiável para designar a dimensão espiritual do homem.
Em Eclesiastes 12.7 lemos:
“E o pó volte à terra, como o
era, e o espírito volte a Deus, que o deu.”
Neste texto, quando o autor
menciona que o “espírito volta a Deus”, a referência inclui também a alma, pois
ambos são inseparáveis. Não é apenas o espírito que retorna a Deus, conforme
afirmam alguns grupos heterodoxos¹.
De forma semelhante, em
Apocalipse 6.9:
“E, havendo aberto o quinto
selo, vi debaixo do altar as almas dos que foram mortos por amor da palavra de
Deus e por amor do testemunho que deram.”
Quando João declara que “viu as
almas dos que foram mortos”, entende-se que o espírito também estava presente,
uma vez que ambos constituem a parte imaterial e indissociável do ser humano,
mesmo após a morte do corpo.
A segunda verdade presente em
Mateus 10.28 é que a parte imaterial do ser humano é imortal e não pode
ser destruída pelo homem. O máximo que o ser humano pode fazer é matar o corpo;
contudo, este será reunido à alma e ao espírito na ressurreição, seja do
justo — para a vida eterna —, seja do ímpio — para a condenação eterna².
Por fim, Jesus ensina que os
ímpios serão lançados no lago de fogo em sua totalidade — espírito, alma e
corpo. Os aniquilacionistas³ afirmam que os ímpios deixarão de existir,
mas o termo grego usado por Jesus, apollymi, traduzido por “perecer”,
não indica aniquilação, e sim ruína ou destruição contínua. A palavra
resulta da junção de apo (“separação”) e ollymi (“ruína,
destruição, morte”), significando “separar para a destruição”. Assim, o sentido
transmitido por Cristo é o de sofrimento eterno, conforme 2
Tessalonicenses 1.9:
“Os quais, por castigo,
padecerão eterna perdição (aiōnios ollymi), ante a face do Senhor e a glória do
seu poder.”
2. Imaterialidade e
responsabilidade pessoal
Ao dizer que Deus pode “fazer
perecer no inferno [gr. gehenna] tanto a alma como o corpo”, Jesus
refuta várias concepções materialistas, antigas e modernas, sobre a natureza
humana.
No Livro de apoio, o comentarista apresentou algumas dessas concepções antropológicas materialistas. Segundo um esboço do teólogo Norman
Geisler⁴, as principais visões antropológicas podem ser resumidas da
seguinte forma:
- Materialismo antropológico: o ser humano
possui apenas corpo, inexistindo alma imaterial;
- Epifenomenalismo antropológico: a alma é um
produto ou reflexo do corpo, semelhante a uma sombra;
- Idealismo antropológico: apenas a mente
existe, e o corpo é mera ilusão;
- Monismo antropológico: alma e corpo são duas
faces de uma mesma substância, como o interior e o exterior de um mesmo
objeto.
Jesus, porém, reafirma que o
homem é composto por duas substâncias distintas — uma material e outra
espiritual —, dotado de liberdade moral, pecaminosidade, e destinado à
ressurreição.
Além das concepções filosóficas,
há ideologias materialistas que negam a existência da alma e a vida após
a morte. O marxismo, elaborado por Karl Marx e Friedrich
Engels, é uma das mais influentes. Segundo sua filosofia, o ser humano é
produto das estruturas socioeconômicas, e não um ser moralmente responsável. A
partir dessa visão, o pecado é reinterpretado como opressão social, e não como
rebelião contra Deus.
Contudo, qualquer ideologia que
prometa resolver os problemas humanos por meio de reformas políticas ou
econômicas incorre no mesmo erro. Somente Jesus Cristo pode resolver o
problema do pecado. Sua promessa não é reformar este mundo, mas salvar
os que nele creem para viverem com Ele eternamente no novo céu e nova terra
(Ap 21.1–7).
3. Materialismo e teologia
A influência materialista também
alcançou a teologia. Alguns pensadores marxistas tentaram conciliar a Bíblia
com o socialismo, originando o chamado Evangelho Social, que interpreta
as Escrituras à luz da filosofia marxista, reduzindo o Evangelho à mera
redistribuição de riqueza e à luta contra desigualdades.
Desse movimento surgiu, na Igreja
Católica da América Latina, a Teologia da Libertação, que defende que a
libertação trazida por Cristo é primordialmente econômica e social.
Segundo essa corrente, Jesus não veio libertar do pecado, mas livrar os pobres
da opressão dos ricos. Por isso, muitos de seus adeptos passaram a justificar invasões
de terras, militância política e até ações violentas em nome da “revolução
cristã”.
No meio protestante, surgiu uma
vertente semelhante: a Teologia da Missão Integral (TMI), cujo principal
expoente foi o pastor equatoriano René Padilla (1932–2021). Em sua obra O
Reino de Deus e a Igreja (1984), Padilla propõe que Jesus não veio apenas
salvar a alma, mas transformar toda a sociedade.
No Brasil, teólogos e pastores
como Caio Fábio, Ariovaldo Ramos, Ed René Kivitz, Ricardo
Gondim, entre outros, difundiram essa perspectiva. Alguns deles aderiram
posteriormente à teologia liberal e ao teísmo aberto. Ed René
Kivitz chegou a afirmar que a Bíblia precisa ser “ressignificada” e
“atualizada”, enquanto Ricardo Gondim declarou publicamente seu rompimento com
o movimento evangélico, pedindo perdão à comunidade homossexual por críticas
feitas anteriormente.
A distinção entre corpo e alma é
uma verdade revelada nas Escrituras e confirmada pela experiência espiritual do
ser humano. A alma é imaterial, imortal e responsável moralmente diante de
Deus. Qualquer doutrina ou ideologia que negue essa realidade — seja
filosófica, política ou teológica — afasta-se da verdade do Evangelho.
Somente em Cristo encontramos a verdadeira libertação: não a libertação
socioeconômica, mas a redenção do pecado e a vida eterna.
Notas
- Cf. Hebreus 4.12: “Porque a palavra de Deus é viva
e eficaz... e apta para discernir os pensamentos e intenções do coração”,
onde alma e espírito são distinguidos, mas não separados.
- Cf. João 5.28–29; Daniel 12.2.
- Doutrina que afirma a destruição total dos ímpios
após o juízo final, negando o castigo eterno.
- GEISLER, Norman L. Teologia Sistemática: Antropologia, Hamartiologia, Soteriologia. São Paulo: Vida, 2004.
Referências
- ARA = Almeida Revista e Atualizada.
- GEISLER, Norman L. Teologia Sistemática. São
Paulo: Vida, 2004.
- PADILLA, René. O Reino de Deus e a Igreja.
Buenos Aires: Kairós, 1984.
- BÍBLIA SAGRADA. Almeida Revista e Atualizada.
Barueri: Sociedade Bíblica do Brasil, 2011.
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