(Comentário do 3º tópico da Lição 9: A contade - o que move o ser humano)
No terceiro e último tópico, trataremos do ensino de Tiago a respeito dos desejos. Abordaremos a relação entre atração e engano. Tiago utiliza a palavra concupiscência para se referir aos desejos carnais que afetam a razão humana e levam o ser humano a pensar que o pecado não traz consequências. Em seguida, falaremos da necessidade de abortar os maus desejos e interromper o processo da tentação, que induz o ser humano ao pecado.
1. Atração e engano.
No texto de Tiago 1.14-15, integrante da leitura bíblica em classe, o apóstolo declara:
“Mas cada um é tentado, quando atraído e engodado pela sua própria concupiscência. Depois, havendo a concupiscência concebido, dá à luz o pecado; e o pecado, sendo consumado, gera a morte.”
A partir do versículo 12, Tiago passa a tratar especificamente da temática da provação e da tentação. Ele afirma:
“Bem-aventurado o varão que sofre a tentação; porque, quando for provado, receberá a coroa da vida, a qual o Senhor tem prometido aos que o amam.” (Tg 1.12, ARC)
A palavra grega traduzida por “tentação” na versão Almeida Revista e Corrigida é peirasmós, termo que designa experimento, tentativa, teste ou prova, no sentido de submeter alguém a um exame de fidelidade. A Nova Versão Transformadora (NVT) verte este vocábulo por “provação”, tradução mais adequada ao contexto imediato, especialmente porque no versículo subsequente Tiago declara:
“Ninguém, sendo tentado, diga: De Deus sou tentado; porque Deus não pode ser tentado pelo mal, e a ninguém tenta.”
Embora a mesma verbo grego— peirádzō — seja empregada tanto para “tentar” quanto para “provar”, o seu significado varia conforme o contexto. Em determinados casos, refere-se a testar alguém de maneira maliciosa, com o intuito de induzi-lo ao pecado. Tal modalidade de tentação é atribuída ao diabo e aos espíritos malignos, cujo propósito é conduzir o ser humano às práticas pecaminosas.
No sentido positivo, contudo, Peirádzō descreve o ato de provar ou examinar a fidelidade de alguém, não com o propósito de instigá-lo ao mal, mas de revelar e fortalecer sua integridade por meio da experiência. Nesse âmbito, trata-se da provação que procede de Deus. Cabe ressaltar que o Senhor não permite que sejamos provados além de nossa capacidade e jamais nos abandona no processo da provação.
Após afirmar que bem-aventurado é aquele que suporta a provação e que Deus não tenta ninguém — visto que não pode ser tentado pelo mal — Tiago descreve o percurso que conduz do desejo ilícito à consumação do pecado.
A tentação se estabelece quando o ser humano é atraído, como presa conduzida a uma armadilha, e engodado, como peixe seduzido por uma isca. Tal atração e sedução se dão por meio da cobiça. O termo grego utilizado, epithumía, anteriormente traduzido por “concupiscência”, indica desejo intenso, anseio profundo, ou mesmo desejo por aquilo que é moralmente proibido, como as expressões de luxúria. As traduções mais recentes adotam, de forma apropriada, o termo “cobiça”.
Uma vez atraído e seduzido, o indivíduo permite que a cobiça “conceba”, gerando o pecado. Tiago emprega o verbo grego syllambánō, aqui traduzido por “concebido”, em sentido figurado, para ilustrar o ato de ceder à tentação. Assim, o pecado é engendrado na alma humana e, quando plenamente consumado, produz a morte espiritual, entendida como o rompimento da comunhão com Deus.
2. Abortando o processo.
Em qualquer uma das fases anteriormente mencionadas, é possível interromper o processo da tentação e impedir que o pecado se concretize. Conforme exposto, a tentação se estabelece quando o indivíduo é atraído e seduzido por seus próprios desejos. Ciente disso, o inimigo se empenha em apresentar a cada pessoa aquilo que exerce maior poder de atração sobre ela e, de maneira sutil, induz à ideia de que não há mal algum na prática tentadora.
É fundamental ressaltar que o inimigo não possui os atributos divinos da onisciência e da onipresença; ele não conhece nossos pensamentos e intenções, nem está presente em todos os lugares simultaneamente. Todavia, mediante a atuação de seu exército organizado, é capaz de observar a conduta humana, identificar vulnerabilidades e preparar a dose de tentação adequada para cada indivíduo. Assim, alguém que sempre rejeitou o cigarro, mesmo antes da conversão, dificilmente será tentado nessa área; contudo, poderá ser confrontado com tentações condizentes com suas fragilidades, como seduções de cunho moral ou propostas ilícitas de benefício financeiro.
a) Abortando a tentação na fase da atração. Para impedir que a atração inicial evolua para sedução e, posteriormente, para o pecado, alguns princípios são essenciais:
Andar no Espírito
Andar no Espírito impede que a carne encontre ocasião para manifestar seus impulsos, direcionando a inclinação do crente para as coisas de Deus. Uma vida de comunhão — marcada por oração, jejum, leitura e meditação na Palavra — impede que os desejos carnais encontrem espaço no interior do cristão.Vigilância e fechamento de brechas
É imprescindível evitar ambientes, situações e influências que possam despertar ou intensificar desejos ilícitos. A vigilância constante previne que a atração se transforme em consentimento.
b) Abortando a tentação após a concepção do pecado. Caso a tentação avance e o pecado seja “concebido”, ainda assim existe a possibilidade de interromper o processo. Isso se dá por meio de:
Recepção humilde da repreensão do Senhor através das Escrituras;
Reconhecimento do perigo espiritual e súplica por perdão;
Afastamento imediato de toda aparência do mal.
Se o pecado já alcançou o nível do pensamento, ele foi gerado, mas ainda pode ser abortado. Quando o desejo pecaminoso deixa de ser alimentado, morre por inanição. Entretanto, se continuar sendo nutrido, chegará à consumação e conduzirá o crente à morte espiritual.
c. Após a consumação do pecado: ainda há esperança? Mesmo na fase final, quando a cobiça gerou o pecado e este se consumou, ainda há esperança de restauração. O apóstolo João declara:
“Meus filhinhos, estas coisas vos escrevo para que não pequeis; e, se alguém pecar, temos um Advogado para com o Pai, Jesus Cristo, o Justo. E Ele é a propiciação pelos nossos pecados; e não somente pelos nossos, mas também pelos de todo o mundo.” (1 Jo 2.1-2)
Enquanto estivermos neste mundo, sujeitos à natureza pecaminosa, estamos propensos a cair. O dever cristão é vigiar e orar para não entrar em tentação. Todavia, caso o pecado se concretize — excetuando-se a blasfêmia contra o Espírito Santo, que é imperdoável — ainda existe possibilidade de perdão. Jesus Cristo permanece como nosso Advogado diante do Pai, pronto a conceder-nos perdão mediante sincero arrependimento, conforme afirma João:
“Se confessarmos os nossos pecados, Ele é fiel e justo para nos perdoar os pecados e nos purificar de toda injustiça.” (1 Jo 1.9)