(Comentário do 2º tópico da Lição 11)
Conforme falamos no tópico anterior, Jesus não proibiu o cristão de emitir opiniões e não condenou os julgamentos que são necessários. Entretanto, o Mestre condenou a hipocrisia dos que vêem apenas os erros dos outros e ignoram os próprios erros. São extremamente severos em relação aos erros alheios e muito complacentes consigo mesmos. A Bíblia está repleta de exemplos de pessoas que foram extremamente intolerantes com relação aos pecados alheios, enquanto encobriam coisas gravíssimas de si mesmas. Usavam um duplo padrão de medida: a da misericórdia para si e o da punição severa para os outros. O ensino de Jesus aqui é: Com a medida que medirmos os outros seremos também medidos. Por isso, devemos sempre olhar primeiro para nós mesmos, antes de olhar para o próximo.
1 - Cuidado com o juízo exagerado sobre os outros. Segundo a psicologia, o ser humano tem dentro de si um mecanismo de defesa chamado projeção, que consiste em projetar de modo inconsciente no outro, aqueles comportamentos que ele não tolera em si mesmo. Assim, ele acaba atacando no outro um comportamento que, na verdade, ele gostaria de fazer ou faz. É por isso que muitas vezes o caloteiro é um excelente cobrador e uma pessoa muito ciumenta, trai ou tem vontade de trair. É também uma forma de desviar o foco dos próprios erros, atacando os dos outros.
Temos na Bíblia vários casos de pessoas que foram implacáveis com os erros dos outros, quando na verdade, escondiam coisas muito piores praticadas por elas mesmas. Em Gênesis 38 temos o caso de Judá e sua nora Tamar. Er, o primeiro filho de Judá casou-se com Tamar. Ele era perverso e, por isso, o Senhor o matou, sem que deixasse descendência. Pela lei do Levirato, o próximo irmão dele deveria casar-se com a viúva e o primeiro filho seria do falecido.
Onã, o segundo filho casou-se com Tamar e aconteceu a mesma coisa. Selá, o terceiro filho, ainda era pequeno e foi prometido em casamento à viúva dos seus irmãos. Entretanto, o tempo foi passando e Tamar percebeu que o seu sogro não iria cumprir a promessa. Ela, então, disfarçou-se de prostituta e engravidou do sogro. Porém, antes exigiu que ele lhe desse o seu selo, seu cordão e o cajado, que eram objetos pessoais que representavam a autoridade de Judá na família.
Quando Judá soube que a nora estava grávida, sem saber que era ele o pai, determinou que ela fosse queimada viva. Tamar, então apresentou os objetos pessoais do seu sogro, dizendo que o pai da criança era o proprietário daqueles objetos. Judá, imediatamente recuou da condenação rigorosa e disse que ela era mais justa do que ele, pois, ele havia prometido o seu filho a ela em casamento e não havia cumprido. Os dois erraram gravemente, não restam dúvidas. Mas, ele encobria o próprio erro e queria ser rigoroso com o pecado da nora.
Outro exemplo desse tipo de comportamento é o do rei Davi, depois de ter cometido adultério com Batseba e homicídio contra o marido dela. Ele escondeu estes dois pecados durante dois anos, se comportando como se nada tivesse acontecido. Mas Deus enviou o profeta Natã para repreendê-lo. O profeta contou-lhe uma parábola, dizendo que um homem rico tinha muitos animais em sua fazenda e o seu empregado tinha apenas uma ovelha que ele criara junto com os seus filhos, como se fosse um deles. Certo dia, veio um visitante ilustre à casa deste rico fazendeiro e ele, em vez de pegar uma das suas muitas ovelhas, pegou a do seu empregado e deu-a ao visitante.
Ouvindo esta história, irritado, Davi levantou-se e decretou a sentença:
- Digno de morte é o homem que fez tal coisa!.
O profeta o interpelou, dizendo:
- Este homem és tu, ó rei!
O profeta, usado por Deus, lembrou a Davi de que o Senhor o tirara de trás das ovelhas, livrou-o das mãos de Saul e o fez rei de Israel. Deu-lhe também mulheres. Mas ele desprezou a Palavra do Senhor, tomou a mulher do seu servo e tramou o seu assassinato de forma covarde. O senso de justiça inicial de Davi não estava errado, mas, era exagerado. Quem praticasse uma injustiça daquela, de fato deveria ser punido, mas, não com a morte. A punição prevista na lei para o roubo de uma ovelha seria restituir quatro vezes o valor. Os pecados dele sim, eram punidos com a morte, tanto o adultério quanto o homicídio.
O outro problema de Davi é que a partir das palavras do profeta de que ele era o infrator, o rigor do seu julgamento desapareceu. De fato, ele se arrependeu e confessou a sua culpa. Mas, não proferiu nenhuma sentença de morte contra si mesmo. É assim que muitas pessoas agem. Usam um padrão duplo de julgamento, um para si e sua família e outro para as outras pessoas.
A recomendação bíblica é para nos examinarmos a nós mesmos (1 Co 11.28) e tirar primeiro a trave que está em nossos olhos, para depois olhar para o argueiro que está no olho do nosso próximo. Quando olhamos primeiro para nós, detectamos os nossos erros e olhamos para os outros com o olhar de misericórdia, com o objetivo de corrigi-los e ajudá-los.
2- A inconsistência dos que possuem espírito de crítica. Os escribas e fariseus se consideravam os mestres e intérpretes da Lei mosaica. Conforme já vimos em lições anteriores, as pessoas não tinham as Escrituras em suas casas e a maioria não sabia ler. Portanto, dependiam exclusivamente da leitura e explicação dos rabinos. Sendo assim, eles abusavam do poder religioso e impunham ao povo pesados fardos. Eram muito rigorosos em seus julgamentos e vasculhavam a vida das pessoas, buscando falhas para os acusar. Eles faziam isso com Jesus o tempo todo, com perguntas ardilosas, a fim de apanhá-lo em algum erro para acusá-lo e condená-lo à morte.
Jesus não condenou o justo julgamento, baseado na verdade, coerência e consistência. O próprio Jesus condenou muitas atitudes dos escribas e fariseus (Mt 23), de Herodes (Lc 13.32) e até dos próprios discípulos (Lc 9.55), quando se tornaram repreensíveis. O julgamento verdadeiro, tendo como base a Palavra de Deus, com o objetivo de zelar pela Sã doutrina e para evitar a contaminação da Igreja é válido. Entretanto o espírito crítico, que busca a todo custo encontrar falhas nos outros, com propósitos espúrios e ar de superioridade em relação aos demais, é incompatível com a vida cristã.
3- O que fazer para não julgarmos precipitadamente os outros? Conforme já foi dito e repetido, Jesus não proibiu o julgamento e a correção necessária de coisas erradas. Ele proibiu os julgamentos precipitados dos outros, sem olhar para os os nossos próprios erros. Temos a tendência de enxergarmos até os pequenos erros dos outros, mas não enxergamos erros graves da nossa parte. Somos muitas vezes brandos com nós mesmos e severos com os outros. Por isso, Jesus disse que seremos medidos com a mesma medida que medirmos. O que fazer, então para evitar fazer julgamentos precipitados e não adotar o espírito da crítica para com os pecados alheios?
Devemos sempre nos lembrar que também somos falhos e imperfeitos. Mesmo sendo transformados pelo Espírito Santo, não somos perfeitos e ainda cometemos erros, embora, não por prazer, mas, por causa das nossas falhas e limitações. Precisamos também adotar a mesma atitude que Jesus teve para conosco. Ele nos amou e morreu por nós, sendo nós ainda pecadores (Rm 5.8). Sendo assim, devemos lembrar que fomos alcançados pelo favor imerecido de Deus e oferecer também misericórdia e compaixão para com os outros pecadores. Em vez de julgar e condenar os que pecarem, devemos orar para que o Senhor os perdoe e os ajude a recomeçar.
REFERÊNCIAS:
GOMES, Osiel. Os Valores do Reino de Deus: A Relevância do Sermão do Monte para a Igreja de Cristo. Editora CPAD. 1ª edição: 2022. pág. 209-214.
CHAMPLIN, Russell Norman. Antigo Testamento Interpretado versículo por versículo. Editora Hagnos. pág. 1276.
PURKISER, T. M. A. Comentário Bíblico Beacon I e II Samuel. Editora CPAD. Vol. 3. pág. 246.
LOPES, Hernandes Dias. Mateus Jesus, o Rei dos reis. Editora Hagnos. pag. 237.
STOTT, John. Contracultura cristã. A mensagem do Sermão do Monte. Editora: ABU, 1981, pág. 82,83.
RICHARDS, Lawrence O. Comentário Devocional da Bíblia. 2.ed. Rio de Janeiro: CPAD, 2013, p.560.
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Pb. Weliano Pires
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