(Comentário do 1º tópico da Lição 10: O pecado corrompeu a natureza humana)
Ev. WELIANO PIRES
No primeiro tópico, estudaremos a doutrina bíblica do pecado e sua extensão. Este tópico é bem mais extenso que os demais, pois a doutrina do pecado tem uma abrangência maior do que as heresias sobre ele. Por isso, o comentarista dedicou quatro subtópicos para falar deste assunto. Inicialmente veremos quem foi o autor do pecado. Na sequência, falaremos da expressão “foram abertos os olhos de ambos” (Gn 3.7), referindo-se ao primeiro casal que desobedeceu a Deus e perceberam a sua nudez. Falaremos também das consequências da Queda do primeiro casal. Por fim, falaremos da extensão do pecado, que corrompeu o ser humano em sua totalidade: espírito, alma e corpo.
1. O autor do pecado (Gn 3.1,2). Antes de falarmos do autor do pecado, é importante esclarecer o que é pecado, do ponto de vista bíblico, pois há muitos equívocos em relação a isso. Na Bíblia, há algumas palavras hebraicas e gregas que foram usadas para se referir ao pecado:
a) O termo hebraico “chata’th” e o seu correspondente grego “hamartia”. Sgnifica “errar o alvo”. Literalmente é uma referência a um atirador que atira uma flecha e erra o seu alvo. O alvo de todo ser humano é atingir a obediência total a Deus. Se ele falha nessa obediência, “erra o alvo” e, portanto, comete pecado.
b) termo hebraico “avon” e o seu correspondente grego “adíkia”. Significa “falta de integridade”. Estas duas palavras foram traduzidas em nossas Bíblias por “injustiça” e tem o sentido de praticar coisas injustas e desonestas contra o próximo, como, por exemplo, dar um falso testemunho para condenar um inocente, ou mentir para absolver o culpado.
c) O termo hebraico “pesha” e o seu correspondente grego “parábasis”. Significa rebeldia ou uma completa rejeição e insubordinação à autoridade de Deus. Deus é o Soberano de todo o Universo. Em todos os seus atos e palavras, Deus é sempre justo. Insurgir-se contra a autoridade de Deus e querer viver segundo o próprio pensamento, portanto, é pecado.
d) O termo hebraico “resha” e o seu correspondente grego “anomia”. Significa ilegalidade, ou “fuga culposa da lei”: “Todo aquele que pratica o pecado também transgride a lei, porque o pecado é a transgressão da lei.” (1 Jo 3.4). Deus é o Criador de todas as coisas, inclusive do ser humano. Sendo o Criador e sustentador de todo o universo, Ele criou as próprias leis, que estão registradas na Bíblia Sagrada. A desobediência a estas leis constitui-se em pecado contra Deus.
Sobre a autoria do pecado, há também controvérsias, inclusive entre teólogos que se dizem evangélicos. Os hiper calvinistas, superenfatizam a Soberania de Deus e anulam completamente a responsabilidade humana. Chegam ao cúmulo de dizer que Deus criou o pecado. Para justificar esta aberração, usam o texto de Isaías 45.7, que diz: “Eu formo a luz, e crio as trevas; eu faço a paz, e crio o mal; eu, o Senhor, faço todas estas coisas”. Entretanto, a palavra traduzida por “mal” neste texto, significa “calamidade”, como está na Nova Versão Transformadora (NVT), e não mal moral ou pecado.
O Calvinismo, embora não admita abertamente que Deus criou o pecado, ensina que Deus preordenou todas as coisas, inclusive a Queda do primeiro casal. Dizem que Deus preordenou também que um grupo de pessoas seriam salvas (os eleitos) e outro grupo, não seriam salvas (os não-eleitos). Segundo o Calvinismo, todas as coisas que acontecem no Universo, boas ou más, foram predeterminadas por Deus. Isso equivale a dizer que Deus é o autor do pecado. Na Confissão de Westminster, uma confissão de fé de orientação calvinista, está escrito: “Desde toda a eternidade, Deus, pelo muito sábio e santo conselho da sua própria vontade, pré-ordenou livre e inalteravelmente tudo quanto acontece.”
Atribuir a Deus a autoria do pecado é ofender o Seu caráter santo. Deus criou todas as coisas boas e perfeitas, inclusive o ser humano. O pecado é algo que afronta a santidade de Deus e jamais poderia ter origem nele. A origem do pecado no universo é anterior à criação do homem e teve início nas regiões celestiais, com um querubim ungido que era o mais exaltado entre os seres angelicais e rebelou-se contra Deus (Ez 28.12,14; Is 14.12-15). Por causa disso, ele foi expulso do Céu com uma terça parte dos anjos.
A Bíblia não revela o nome próprio deste querubim, mas chama-o de alguns títulos que revelam a sua natureza maligna como Satanás e Diabo. A palavra Satanás é a transliteração grega do termo hebraico “Satan”, que significa “adversário”. A palavra diabo, é a transliteração portuguesa do termo grego “diabolos”, que significa “acusador”. A palavra latina “Lúcifer” é a tradução da expressão “estrela da manhã", que aparece em Isaías 14.12, e foi entendida por Jerônimo como sendo o nome próprio deste querubim. Foi este querubim rebelde, que enganou Eva e a induziu ao pecado, induzindo também o seu marido ao mesmo erro.
2. “Foram abertos os olhos de ambos” (Gn 3.7). O inimigo em sua astúcia prometeu a Eva que eles seriam como Deus, se comessem do fruto proibido. Atraída pela possibilidade de ser igual a Deus, a mulher deu ouvidos ao inimigo e desobedeceu a Deus. Em seguida deu o fruto também ao seu marido e ele comeu. No mesmo instante, perceberam que estavam nus e tentaram se esconder da presença de Deus. Eles viviam nus anteriormente e não se envergonhavam, pois não havia nenhuma espécie de maldade em seu interior.
Em vez de se tornarem iguais a Deus como o inimigo prometera, veio a ruptura imediata da comunhão com Deus. Após a Queda do primeiro casal, Deus deu a sentença ao homem, à mulher e à serpente, que era a personificação do inimigo. O casal foi expulso do Jardim do Éden e perdeu imediatamente a comunhão com Deus, pois Ele é absolutamente santo e não pode tolerar pecado.
Com a entrada do pecado no mundo, o corpo humano passou a ser mortal em todos os aspectos. Primeiro veio a morte espiritual, que é a perda da comunhão com Deus. Fisicamente também, o ser humano se tornou mortal e, como tal, está sujeito às doenças e à morte. O corpo humano, antes do pecado era imortal e não adoecia, pois foi criado para viver eternamente. Com o advento do pecado, o corpo humano perdeu a imortalidade e deixou de ser imune às doenças.
Quando nasce, o ser humano começa a morrer. É como se ligasse um cronômetro com contagem regressiva. Cada dia vivido é um dia a menos no tempo de vida. Primeiro, vem a fase do crescimento, até chegar a vida adulta. Depois, vem a fase do envelhecimento, até finalmente chegar a morte. Em cada fase da vida, há riscos de várias doenças no nosso corpo e, consequentemente, o risco de morte. Mas, a pior consequência do pecado é a morte eterna.
Junto com a sentença que Deus deu à serpente, Deus apresentou também, em Gênesis 3.15, a primeira promessa de Salvação da humanidade, que é chamada de Proto Evangelho. Nesta promessa, Deus disse que o descendente da mulher feriria a cabeça da serpente e ela lhe feriria o calcanhar. É uma referência à vinda de Cristo, para derrotar o inimigo e salvar os pecadores. Este será o assunto da próxima lição.
3. A consequência da Queda no Éden. A Queda do primeiro casal trouxe consequências terríveis não apenas para eles, mas para a sua posteridade. O apóstolo Paulo, escrevendo aos Romanos disse: “Pelo que, como por um homem entrou o pecado no mundo, e pelo pecado, a morte, assim também a morte passou a todos os homens, por isso que todos pecaram” (Rm 5.12). No mesmo capítulo, no versículo 19, Paulo escreveu: “Porque, como pela desobediência de um só homem, muitos foram feitos pecadores, assim pela obediência de um muitos serão feitos justos”.
Quando nascemos, a nossa natureza já está corrompida pelo pelo pecado. Nós não nos tornamos pecadores quando cometemos algum pecado. Ao contrário, pecamos porque somos pecadores. Davi disse: “Eis que em iniquidade fui formado e em pecado me concebeu a minha mãe”. (Sl 51.5). Isso não se refere, é claro, ao relacionamento sexual como alguns ensinam, pois este foi criado e abençoado por Deus. Significa que todos os seres humanos, sem exceção, nascem corrompidos pelo pecado e ninguém precisará ensiná-los a pecar.
Algumas pessoas, equivocadamente, dizem que as crianças nascem sem pecado, mas isso não é verdade. Todos nascemos pecadores e separados de Deus. Entretanto, Deus não imputa o pecado às crianças e aos deficientes mentais, que não tem condições de compreender e crer no Evangelho. Quando Jesus disse: “Deixai vir a mim as crianças, porque das tais é o Reino dos Céus” (Mt 19.14), não significa que não são pecadores, mas que Deus não os responsabiliza pelo pecado, por não serem capazes de entender. É por isso que não batizamos crianças.
4. Extensão do pecado. Conforme falamos acima, o pecado de Adão e Eva não atingiu apenas o casal, mas se estendeu à sua posteridade e corrompeu a totalidade do seu ser: espírito, alma e corpo. Deus criou o ser humano perfeito e sem maldade, e com liberdade de escolha. Mas, com a entrada do pecado no mundo, a natureza humana foi corrompida. As três faculdades interiores do ser humano: intelectual, emocional e vontade, foram corrompidas pelo pecado.
A forma de pensar do homem foi afetada pelo pecado. O intelecto humano, sem a ação do Espírito Santo, é essencialmente mal. Muitas religiões sugerem que o homem siga o seu pensamento. Mas, isso é um grande erro. O homem, de si mesmo, não pensa coisas boas. Em Jeremias 17.9 lemos: “Enganoso é o coração, mais do que todas as coisas, e desesperadamente corrupto; quem o conhecerá?”. Se vivêssemos em uma anarquia, onde cada um pudesse fazer o que bem entendesse, seria um caos generalizado. Na Igreja também, muitas pessoas querem fazer o que bem entendem e não aceitam a correção pela Palavra de Deus. Mas não pode ser assim, pois a Igreja é guiada pelo Espírito Santo.
Da mesma forma, as emoções humanas também foram afetadas pelo pecado. O homem longe de Deus tem sentimentos carnais, egoístas e malvados. O homem carnal odeia, deseja mal, inveja, cobiça e não sente nenhuma tristeza pelos pecados cometidos. Se o homem seguir as próprias emoções, cometerá toda sorte de maldade. Infelizmente, muitas pessoas na Igreja, equivocadamente, agem seguindo as próprias emoções, dizendo que estão sentindo de fazer ou deixar de fazer alguma coisa. Mas, o crente deve ser guiado pela Palavra de Deus e não pelos próprios sentimentos.
O pecado corrompeu também a vontade humana e, por isso, o ser humano se afastou da vontade de Deus e seguiu os desejos da sua natureza corrompida. O pecado corrompeu a vontade do ser humano de tal forma que por si mesmo, ele é incapaz de buscar a Deus. Entretanto, como bem colocou o comentarista, o pecador não perdeu o livre-arbítrio que Deus lhe concedeu.
Partindo do princípio de que a vontade humana foi corrompida pelo pecado, os calvinistas ensinam que o homem perdeu também a capacidade de escolher servir a Deus ou não. Entretanto, não é isso que a Bíblia ensina. O Espírito Santo trabalha no intelecto humano e em seus sentimentos, para levá-lo a reconhecer-se como pecador, que necessita de salvação. Mas a decisão de fazer ou não a vontade de Deus, continua sendo do homem.
Em vários textos bíblicos, encontramos Deus colocando diante do ser humano a decisão:
“Os céus e a terra tomo hoje por testemunhas contra vós, de que te tenho proposto a vida e a morte, a bênção e a maldição; escolhe pois a vida, para que vivas, tu e a tua descendência.” (Dt 30.19); “Se vos parece mal aos vossos olhos servir ao Senhor, escolhei hoje a quem sirvais; se aos deuses a quem serviram vossos pais, que estavam além do rio, ou aos deuses dos amorreus, em cuja terra habitais; porém eu e a minha casa serviremos ao Senhor.” (Js 24.’5). “Se alguém quer vir após mim, negue-se a si mesmo, e tome cada dia a sua cruz, e siga-me.” (Lc 9.23); “...E quem tem sede venha; e quem quiser tome de graça da água da vida. (Ap 22.17c).
REFERÊNCIAS:
SOARES, Esequias. Em defesa da Fé Cristã: Combatendo as antigas heresias que se apresentam com nova aparência. RIO DE JANEIRO: CPAD, 1ª Ed. 2025.
Revista Ensinador Cristão. RIO DE JANEIRO: CPAD, Ed. 100, 2025, p. 41.
Bíblia de Estudo Pentecostal. RIO DE JANEIRO: CPAD, 1995, pp.34-36
GILBERTO, Antônio, et al. Teologia Sistemática Pentecostal. RIO DE JANEIRO: CPAD, p.312
CABRAL, Elienai. O apóstolo Paulo: Lições da vida e ministério do Apóstolo dos Gentios para a Igreja de Cristo. RIO DE JANEIRO: CPAD, 1ª Ed. 2021.
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