22 fevereiro 2024

AS FORMAS DE DISCIPLINA BÍBLICA

(Comentário do 3º tópico da Lição 08: A disciplina na Igreja).


Ev. WELIANO PIRES


No terceiro tópico, falaremos das formas de disciplina bíblica. Veremos a disciplina bíblica como forma de correção, que contribui para o crescimento espiritual e formação do caráter cristão. Depois falaremos da disciplina como forma de restauração da pessoa que caiu em pecado, mas se arrependeu. Por último falaremos da disciplina como forma de exclusão daqueles que vivem na prática do pecado, escandalizando o Evangelho e recusam-se a abandonar as práticas pecaminosas. 


1. A disciplina como modo de correção (Hb 12.7). Em todos os segmentos da sociedade, cresce a ideia do relativismo moral, segundo o qual, não há certo ou errado e tudo é relativo. O que é certo para uns, pode ser não ser para outros e vice-versa. No mundo atual, dominado pelo politicamente correto, as palavras correção e repreensão não são vistas com bons olhos.


Os pais são desestimulados de corrigir os seus filhos. Os “especialistas” querem colocar filhos e pais no mesmo patamar. Nessa perspectiva, dizem que os pais devem debater com os filhos, para saber se eles concordam ou não com as medidas a serem adotadas. Por causa disso, se os pais forem um pouco mais enérgicos, os filhos ameaçam chamar o Conselho Tutelar e até a Polícia. 


Nas escolas, acontece a mesma coisa. Colocam professores e alunos no mesmo nível. Os professores, que sempre foram autoridades em sala de aula, hoje precisam tomar cuidado com a maneira de falar, para não constrangerem os alunos. Qualquer fala mais enérgica vira bullying, assédio e o professor pode ser punido. 


Eu estava lendo a opinião de uma especialista em educação, sobre correção de provas e, ao falar sobre corrigir provas com caneta vermelha, ela escreveu: "Essa cor carrega uma conotação negativa exatamente por ter sido usada por diversas gerações de docentes apenas para chamar a atenção para os erros. Ela assusta e leva o aluno a uma ansiedade desnecessária". 


Infelizmente, esse tipo de pensamento também chegou às Igrejas. Antigamente, o pastor da Igreja era a autoridade na Igreja e podia repreender os crentes por um comportamento errado, inclusive publicamente. Isso era visto como zelo e cuidado para não escandalizar o Nome do Senhor. Atualmente, até para repreender alguém em particular, precisa ter muito cuidado para não ser processado. 


Há crentes querendo ser mais misericordiosos do que Deus. Estas pessoas acham que repreender ou corrigir o erro de alguém é falta de amor. Quando um pastor repreende alguém que está no erro, muitas pessoas dizem que ele não tem misericórdia e que está jogando a pessoa para fora da Igreja. 


A Bíblia, no entanto, ensina que a correção e a repreensão são necessárias. Paulo escrevendo a Timóteo disse que “Toda Escritura divinamente inspirada é proveitosa para ensinar, para redarguir, para corrigir, e para instruir em justiça. O escritor da Epístola aos Hebreus escreveu: Deus corrige o que ama e açoita ao que recebe por filho.” (Hb 12.7). 


Todos nós erramos e precisamos que alguém nos corrija, para não permanecermos no erro. Quem corrige é porque ama: “Porquanto o SENHOR corrige a quem ama, da mesma forma que o pai repreende.” (Pv 3.12). Quem não corrige e não se importa em ver o outro persistir no erro, não o ama: “Quem não corrige os filhos mostra que não os ama; quem ama os filhos se preocupa em discipliná-los.” (Pv 13.24 NVT).


2. A disciplina como forma de restauração (Gl 6.1). Escrevendo aos Gálatas, o apóstolo Paulo disse: “Irmãos, se algum homem chegar a ser surpreendido nalguma ofensa, vós, que sois espirituais, encaminhai o tal com espírito de mansidão, olhando por ti mesmo, para que não sejas também tentado.” (Gl 6.1). A palavra traduzida por “encaminhai” neste texto, no grego é katartizo, como nos explicou o comentarista. O sentido original aqui é restaurar. 


No texto de Mateus 4.21, lemos que Jesus viu “Tiago, filho de Zebedeu, e João, seu irmão, num barco com Zebedeu, seu pai, consertando as redes…” A palavra traduzida por consertando é katartizo, a mesma usada por Paulo em Gálatas 6.1, que foi traduzida por “encaminhar”. Portanto, o que Paulo quis dizer é que, quando alguém que está fraco for surpreendido em alguma falta, aqueles que são espirituais devem “restaurá-lo” com mansidão. A Nova Almeida Atualizada traduz o texto assim: “... restaurem essa pessoa com espírito de brandura.”


O problema das disciplinas nas Igrejas antigamente é que, além de serem exageradas e em muitos casos sem nenhum fundamento bíblico, o objetivo era apenas punir e até humilhar a pessoa. Não é isso que estamos defendendo aqui, quando falamos de disciplina. O objetivo da disciplina em primeiro lugar é restaurar a pessoa e não excluir. A correção é necessária, como vimos acima, mas o objetivo é a restauração. 


Antes de falarmos em disciplina na Igreja, precisamos primeiro avaliar à luz da Bíblia se, de fato, o ato praticado é pecado. Eu conheci uma jovem que foi suspensa da comunhão da Igreja por cortar as pontas do cabelo. Depois disso, ficou oito meses esquecida e sem tomar a Ceia. Quando o pastor foi substituído, o novo pastor perguntou por que ela estava disciplinada. Ao ouvir o motivo, ele achou um absurdo aquela situação e a colocou em comunhão novamente. 


Casos assim eram comuns e muitos pastores até se orgulhavam disso. O mesmo acontecia com alguns pais que, espancavam os seus filhos publicamente, por motivos fúteis ou por acusações de outras pessoas. Em muitos casos, nem sabiam se eles realmente tinham culpa. Primeiro batiam, para depois perguntar. Ainda contavam vantagem para os outros, querendo mostrar que na casa deles não tinha moleza. 


3. A disciplina como modo de exclusão (1 Co 5.13).  Se as palavras correção e repreensão não são bem vistas pelo politicamente correto, pior ainda ainda é a palavra exclusão. O que está em alta é a inclusão. Claro que há inclusões que são necessárias e louváveis, como no caso de inclusão de pessoas com mobilidade reduzida, deficientes visuais, surdos, mudos, etc. Mas o termo inclusão é usado principalmente em relação a comportamentos que a Bíblia condena. Há até igrejas chamadas de “inclusivas”, que aceitam homossexuais como membros e fazem casamento entre pessoas do mesmo sexo. 


No caso da Igreja, muitas pessoas são totalmente contrárias à ideia de exclusão. Argumentam que o papel da Igreja é buscar os pecadores e nunca excluir. O caso bíblico mais citado para justificar essa tese, é da mulher adúltera, que os fariseus levaram o caso a Jesus para que Ele esse o seu parecer. 


Jesus abaixou a cabeça e começou a escrever na terra. Depois, ergueu a cabeça e disse que aquele que não tivesse pecado, atirasse a primeira pedra. Em seguida, abaixou novamente e voltou a escrever na terra. Acusados pela própria consciência, foram saindo um por um, começando pelos mais velhos, ficando só Jesus e a mulher (Jo 8.1-9). 


Erguendo a cabeça novamente e vendo que todos haviam saído, Jesus perguntou à mulher onde estavam os seus acusadores e se ninguém a havia condenado. Ela respondeu que ninguém a condenara, e Jesus respondeu que Ele também não iria condená-la. (Jo 8.10). 


Há uma frase dita por Jesus no final, que as pessoas a omitem ou duturpam (Jo 8.11). Dizem que Jesus disse à mulher: Vai-te em paz. Mas, em momento algum Jesus disse isso. O que Ele falou foi: Vai-te [não disse em paz] e não peques mais (Confira em Jo 8.11). 


Neste caso acima, os fariseus estava tentando Jesus, a fim de acharem motivos para o condenarem à morte. Qualquer resposta que Ele desse, seria acusado. Se dissesse que a mulher não deveria ser condenada, seria acusado de violar a lei mosaica, que exigia que os adúlteros fossem apredejados. Se dissesse que deveriam apedrejá-la, seria a acusado se ir contra os seus próprios ensinos, pois ele pregava o amor, a misericórdia e o perdão. 


Jesus sempre tratou casos diferentes de forma diferente. Ele tratava o pecador arrependido com misericórdia, como foi o caso de Zaqueu. Mas os escribas e fariseus que eram maquiavélicos e hipócritas, Ele tratava com rigor. No capítulo 23 de Mateus, Jesus os repreendeu duramente, acusando de serem hipócritas, cruéis e fingidos, que tavam fardos pesados para o povo, mas não queriam tocar neles nem com o dedo mínimo. 


Quando falou do pecado de um irmão contra nós, Jesus estabeleceu uma sequência de atitudes da parte ofendida: Primeiro, repreender o ofensor em particular e tentar convencê-lo do erro; se ele não ouvir, a repreensão deve ser feita com duas ou três testemunhas; se ainda assim, ele não ouvir o caso deve ser levado à Igreja; se não ouvir à Igreja, deve ser considerado como gentio e publicano, ou seja, não deve ser considerado mais como irmão (Mt 15.17). 


O apóstolo Paulo também falou do caso de um membro da Igreja de Corinto que mantinha um relacionamento incestuoso com a própria madrasta. Neste caso, ele ordenou que o “o iníquo fosse tirado do seio da Igreja” (1 Co 5.13). Era um caso gravíssimo, que manchava a santidade da Igreja. O apóstolo disse que nem as pessoas de fora praticavam uma imoralidade daquele tipo. Em casos em que a pessoa não aceita a correção e recusa-se a deixar o pecado, a disciplina tem que ser aplicada como forma de exclusão, para preservar a Igreja. 


REFERÊNCIAS:

GONÇALVES, José: O Corpo de Cristo: Origem, Natureza e a Vocação da Igreja no Mundo. RIO DE JANEIRO: CPAD, 1ª Ed. 2023.

ENSINADOR CRISTÃO. RIO DE JANEIRO: CPAD, Nº 96, pág. 40, 1º Trimestre de 2024.

PFEIFFER, Charles F. et al. Dicionário Bíblico Wycliffe. Rio de Janeiro: CPAD, 2006, p.466. 

RICHARDS, Lawrence O. Comentário Histórico-Cultural do Novo Testamento. Rio de Janeiro: CPAD, 2007, pp.510,511.

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