Para a sociedade pós - moderna, que promove a cultura da morte, a vida perde a importância, dando lugar ao bem-estar e à suposta felicidade. Como cristãos, rejeitamos toda e qualquer cultura ou ideologia que atenta contra a vida humana, em qualquer etapa.
WELIANO PIRES
A vida humana é uma dádiva de Deus. No ato da criação do homem, Deus o formou do pó da terra. Em seguida, soprou em suas narinas e, assim, o homem passou a ter vida (Gn 2.7). Deus deu a vida ao ser humano, com a capacidade de se reproduzir. Mas, a nova vida gerada é um também um ato criativo de Deus e pertence a Ele: "Pois em ti está a fonte da vida; graças à tua luz, vemos a luz." (Sl 36.5).
A ideologia progressista promove através da cultura, da educação, da política, da economia e até por meio do poder judiciário a cultura da morte. Esta cultura maligna procura dessacralizar a vida de todas as formas, ferindo a Ética Cristã, que defende que a vida é sagrada em qualquer fase, pois pertence a Deus e cabe única e exclusivamente a Ele decidir sobre ela.
Neste projeto ideológico da cultura da morte, a vida perde a importância, dando lugar ao bem-estar e à suposta felicidade. Neste plano egoísta, estimula-se a chamada eugenia, que é o conceito de que só os fortes e perfeitos devem sobreviver. Eugenia é a seleção dos seres humanos com base em suas características hereditárias com o objetivo de 'melhorar' as gerações futuras. Esta palavra tem origem grega e significa "bem nascido".
Há dois tipos de eugenia: a eugenia negativa e a positiva. A negativa propõe que pessoas com alguma "limitação", doença hereditária, ou mesmo pessoas de etnias diferentes como judeus, negros, ciganos e outras, não se reproduzam, para "melhorar" as futuras gerações. Esta aberração chegou a ser constitucional nos Estados Unidos. A eugenia positiva, por sua vez, consiste em aplicar a teoria da seleção natural, de Charles Darwin, aos seres humanos. Com isso, busca promover a reprodução de pessoas consideradas "aptas" a se reproduzirem.
Na Alemanha, Adolf Hitler tinha a ideia maligna de raça superior, chamada ariana, e não se limitou a esterilizar pessoas de raças consideradas inferiores para não se reproduzirem, mas colocou em prática o extermínio em massa de várias etnias como os judeus, ciganos, negros, etc. Hitler tinha em mente a idéia de "purificar" a sociedade alemã, de seres indesejáveis como deficientes pacientes esquizofrênicos, epiléticos, paralíticos e psicopatas. Para isso, elaborava listas destas pessoas e as transferia dos hospitais para os centros de eutanásia, onde eram mortos através da inalação de gases tóxicos.
A cultura da morte atual, de forma dissimulada, promove também a eugenia, através do descarte de bebês que tenham um diagnóstico de que apresentarão algum problema crônico de saúde como microcefalia, anencefalia e outros. Promovem também a eutanásia, que é a prática colocar fim à vida de pessoas portadoras de doenças incuráveis e prolongadas, para evitar o sofrimento do paciente, a pedido do próprio paciente ou da família. Alguém pode achar que a comparação com o nazismo é desproporcional, mas, a idéia é a mesma, eliminar seres humanos indesejáveis, considerados obstáculos aos projetos egoístas e desumanos.
A sociedade pós-moderna, que é totalmente anticristã e busca desconstruir os valores judaico-cristãos, criou-se também a ideia de que o ser humano deve ter autonomia absoluta sobre o próprio corpo. Nessa perspectiva, alegando a laicidade do estado e os direitos individuais, defendem a legalização das drogas, da prostituição, da eutanásia, do suicídio, da mutilação, do aborto, e de pesquisas com células tronco embrionárias que depois são descartadas.
Os defensores destas liberdades criaram o slogan "meu corpo, minhas regras", como defesa da liberdade de fazer o que quiserem com o corpo, inclusive decidir sobre a própria sexualidade e a vida. Ocorre que, mesmo sendo livre para fazer as suas escolhas, o ser humano não é dono do próprio corpo para profaná-lo e destruí-lo como quiser. O corpo humano foi criado por Deus e recebeu dele o fôlego de vida. Nós não escolhemos as características genéticas, a família onde nascemos, quando nascemos ou quando iremos morrer. Logo não somos donos do corpo.
No caso do aborto, não é o corpo da mãe que está em discussão e sim, um novo ser que está em seu ventre. Matar um ser humano não é, nem pode ser, uma decisão da mulher. O novo ser humano que foi gerado não é uma extensão do corpo da mãe e não tem culpa das circunstâncias que o levaram a ser gerado. Portanto, não pode pagar com a vida pelas decisões erradas de outrem.
A palavra aborto deriva do latim “abortus”, que é a junção de de dois termos latinos “Ab”, que significa "privação', e “ortus” que significa "nascimento". Portanto, aborto é significa literalmente a privação ou impedimento do nascimento. O aborto pode ser espontâneo, ou seja, por causas naturais e acidentais, que independem das ações humanas. Mas, pode ser também provocado por meios de substâncias abortivas ou instrumentos perfurantes, com o intuito de interromper o processo de gestação. O aborto provocado, independente das circunstâncias, é um dos assassinatos mais covardes, pois a vítima além de ser inocente, não tem nenhuma chance de se defender.
No Brasil, o aborto provocado ainda é considerado crime. O artigo 124 do Código Penal prevê pena de detenção, de um a três anos, para quem "provocar aborto em si mesma ou consentir que outra pessoa o provoque". No caso do aborto provocado por terceiro, sem o consentimento da gestante, o artigo 125 prevê pena de reclusão, de três a dez anos. Já o artigo 126 prevê pena de um a quatro anos, para quem provocar aborto com o consentimento da gestante. O código penal de 1940 coloca como exceções apenas os casos de gravidez proveniente de estupro e quando há risco para a vida da mãe.
Já houve várias tentativas de descriminalização do aborto, por iniciativa de parlamentares de esquerda. Mas foram rejeitadas pelo Congresso Nacional. Entretanto, em 2012 o Supremo Tribunal Federal, extrapolando as suas prerrogativas constitucionais, mudou a lei e permitiu o aborto de bebês anencéfalos. Depois, em 2016, a primeira turma do STF, de novo resolveu legislar e decidiu que aborto nos primeiros três meses de gestação, não deve ser considerado crime. Esta decisão, no entanto, valeu apenas para o caso julgado naquela ocasião. Há outro pedido do PSOL, para descriminalização do aborto no STF, aguardando julgamento.
A posição da Convenção Geral das Assembleias de Deus no Brasil (CGADB) é totalmente contrária ao aborto em quaisquer circunstâncias. Em audiência pública, realizada em 2020 no STF, o pastor Douglas Roberto de Almeida representou a CGADB e afirmou categoricamente que "legalizar o aborto é legalizar o assassinato de um ser indefeso e inocente no ventre da mãe”. Falaremos mais sobre isso no próximo tópico, quando trataremos da sacralidade da vida e da posição cristã a esse respeito.
Quando falamos que defendemos a vida e, por conseguinte, somos contra o aborto, os defensores desta prática dizem que um embrião ou feto não é uma vida, é apenas um amontoado de células no útero da mãe. Por causa disso, há muitas discussões filosóficas, jurídicas, religiosas e biológicas sobre o início da vida humana. Alguns acham que o direito à vida deve ser concedido apenas após o nascimento e aos que podem ter “uma vida digna”.
O que é a vida? Quando ela começa? Paula Gabriella Ribeiro Dorigatti de Alencar, em um artigo denominado "O direito à vida - Âmbito jurídico", dá a seguinte definição resumida para vida:
É o processo pelo qual os seres vivos são com uma parte, ao lapso de tempo entre a concepção e a sua morte, é uma entidade que nasceu e ainda não morreu, e é isto que faz com que este ser esteja vivo."
Sobre o início da vida, não há dúvida de que ela começa na concepção. PAULO GUSTAVO GONET BRANCO, diz em seu livro Curso de Direito Constitucional, publicado pela Editora Saraiva:
“O elemento decisivo para se reconhecer e se proteger o direito à vida é a verificação de que existe vida humana desde a concepção, quer ela ocorra naturalmente, que in vitro. O nascimento é um ser humano. Trata-se, indisputavelmente, de um ser vivo, distinto da mãe que o gerou, pertencente à espécie biológica do homo sapiens. Isso é bastante para que seja titular do direito à vida – apanágio de todo ser que surge do fenômeno da fecundação humana”.
Do ponto de vista bíblico, que é o que mais interessa a nós, os cristãos, a vida tem início no momento da fecundação. Falando ao profeta Jeremias, o Senhor disse: "Antes que te formasse no ventre te conheci, e antes que saísses da madre, te santifiquei; às nações te dei por profeta." (Jr 1.5). Na mesma linha de pensamento, o salmista diz no Salmo 139.15,16: "Os meus ossos não te foram encobertos, quando no oculto fui feito, e entretecido nas profundezas da terra. Os teus olhos viram o meu corpo ainda informe; e no teu livro todas estas coisas foram escritas; as quais em continuação foram formadas, quando nem ainda uma delas havia."
Sendo Deus o doador da vida, Ele proibiu expressamente na Lei mosaica, que o ser humano tirasse a vida. O sexto mandamento diz: “Não matarás” (Êx 20.13). Deus valoriza tanto a vida, que Ele determinou que, aquele que matar uma pessoa deve ser punido com a morte: "Quem derramar sangue do homem, pelo homem seu sangue será derramado; porque à imagem de Deus foi o homem criado." (Gn 9.6). "E quem matar a alguém certamente morrerá." (Lv 24.17). Na mesma Lei que Deus deu o mandamento para não matar, Ele ordenou também que, aquele que matasse deveria ser morto.
A vida humana é inviolável em qualquer fase. O primeiro dos direitos da pessoa humana é direito à vida, pois sem ele, os demais não farão nenhum sentido. Do que adiantaria alguém ter direito à liberdade, ao trabalho, à propriedade, etc., se não estiver vivo para desfrutar destes direitos? Portanto, antes de falarmos em direito das mulheres, direito à liberdade, direito de decidir, precisamos falar sobre o direito à vida que o bebê que está no ventre da mãe deve ter.
A posição da Igreja Cristã, em qualquer tema, será sempre fundamentada na Palavra de Deus, que é o nosso manual de doutrina e conduta. Como vimos acima, a Bíblia deixa claro que Deus é o autor da vida e que ela começa na fecundação. Portanto, defendemos que a vida é sagrada e inviolável desde a sua concepção. Por conseguinte, rejeitamos toda e qualquer cultura ou ideologia que atenta contra a vida humana, em qualquer etapa dela, desde a fecundação até à morte natural, deve ser combatida pela Igreja Cristã.
Nós, os cristãos, somos radicalmente contrários ao aborto em qualquer circunstância. Numa gravidez, os abortistas vêem apenas um amontoado de células e defendem que a mulher deve ter o direito de eliminar a criança que ainda não nasceu, como se fosse uma parte indesejada do seu corpo. Entretanto, Deus que é presciente e soberano, vê ali nações que se formarão, profetas, reis, pastores e até o Salvador do mundo, que foi fecundado no ventre da sua mãe, e foi também um embrião e um feto. Somos igualmente contrários à eutanásia, à eugenia, ao suicídio, à tortura e a qualquer tipo de atentado à vida humana. Quem pratica ou apoia estas coisas, não pode ser considerado cristão.
Ninguém se engane, Deus irá requerer todo sangue inocente que foi derramado na terra. Muitos assassinos escaparam dos flagrantes, ou se beneficiarem de brechas das leis e escaparam da punição das leis humanas. Mas não escaparão da Justiça de Deus, no juízo final, quando todos os ímpios serão julgados e condenados pelo Justo Juiz. Ali não haverá propinas, habeas corpus, prescrição de penas, e chicanas ou filigranas jurídicas para absolver assassinos.
Weliano Pires é evangelista da Assembleia de Deus, Ministério do Belém, em São Carlos-SP; bacharel em teologia, articulista, blogueiro evangélico e professor da Escola Bíblica Dominical.
REFERÊNCIAS:
BATISTA, Douglas. A Igreja de Cristo e o império do mal: Como viver neste mundo dominado pelo espírito da Babilônia. 1ª Ed. Rio de Janeiro: CPAD. págs. 60-71.
ANDRADE, Claudionor de. As novas Fronteiras da Ética Cristã. Rio de Janeiro: CPAD, 2015, pp. 70-71
LIMA, Elinaldo Renovato. Ética cristã: Confrontando as questões do nosso tempo. Rio de Janeiro: CPAD, 2002, pp.138-39.
O direito à vida - Âmbito Jurídico - Educação jurídica gratuita e de qualidade: www.ambitojuridico.com.br
BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. 5ª Ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2010, p.445.
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