(Comentário do 3⁰ tópico da Lição 9)
O Jejum e a oração são atos de disciplina, autonegação e humilhação, que demonstram total dependência de Deus. Tanto um como o outro estão presentes em várias religiões: hinduísmo, islamismo, judaísmo, cristianismo e em outras. O jejum serve a propósitos ritualísticos, ascéticos, religiosos, místicos e até políticos, de acordo com a motivação e a crença de cada um.
Entre os judeus, anualmente acontece o chamado Yom Kippur (Dia da expiação), um dia dedicado à contrição, às orações e ao jejum, como demonstração de arrependimento e expiação, em busca do perdão divino. Neste dia os fiéis fazem jejum absoluto e abstém-se de comer, beber, usar calçados de couro, lavar o corpo, passar cremes ou desodorantes, usar eletrodomésticos e de relações sexuais.
No islamismo, exige-se o jejum durante o período do Ramadã ou Ramadão. Este período é um mês sagrado para os muçulmanos. Eles fazem jejum diariamente entre o nascer e o pôr do sol. Segundo a tradição islâmica, o profeta Maomé teria recebido revelações divinas nesse período, no século VII d.C. Os muçulmanos praticam o jejum absoluto do nascer ao pôr do sol, em busca da purificação do corpo e da mente.
Os católicos romanos também praticam o jejum todos os anos, durante os períodos da Quaresma e do Advento. A Quaresma é um período de quarenta dias que antecedem a Páscoa e a ressurreição de Jesus Cristo. Durante a Quaresma, os católicos praticam meditação, penitências e jejum. Já o período do Advento para os católicos, é o início do ano litúrgico. Começa 4 domingos antes do Natal e termina no dia 24 de dezembro. Para os católicos este período não é de festas, mas é de ‘alegria moderada e preparação para receber Jesus.’ Os jejuns católicos são parciais e consistem em tomar apenas uma refeição durante o dia e não ingerir coisas proibidas, como carnes e bebidas.
E para os evangélicos, o que é o jejum? Ele ainda é necessário, ou é uma prática restrita à Lei mosaica? É que iremos estudar neste tópico. Veremos inicialmente a combinação perfeita entre jejum e oração, não como forma de penitência ou autojustificação, como acontece em outras religiões. Depois falaremos sobre os aspectos bíblicos do jejum. Por último, veremos o ensino de Jesus sobre o jejum.
1- Oração e jejum: uma combinação perfeita. Na Bíblia o jejum sempre aparece junto com a oração. Quando o profeta Samuel iniciou o seu ministério como profeta, sacerdote e juiz de Israel, a Arca da Aliança havia sido levada pelos filisteus para a sua terra, durante a guerra e a colocaram no templo do seu deus Dagom. (1 Sm 5.2). No dia seguinte, a estátua de Dagom estava caída e prostrada diante da Arca. Eles insistiram e colocaram novamente a estátua em seu lugar. No dia seguinte, a cabeça e as mãos de Dagom estavam cortadas.
Os filisteus então resolveram retirar a Arca do seu território, mas, por onde eles deixavam a Arca, Deus feria as pessoas com hemorróidas. Estes episódios duraram 20 anos, com a Arca fora de Israel. O povo Israel se lamentou e Samuel recomendou que eles se arrependessem, retirassem os deuses estranhos do meio desses e se preparassem para o Senhor (1 Sm 7.3). Israel fez assim e se congregaram em Mizpá, jejuaram, pediram perdão e Samuel orou por eles (1 Sm 7.5,6). Vemos aqui, que o jejum veio acompanhado de arrependimento e oração.
Da mesma forma, nos dias do rei Josafá, os moabitas, os amonitas e os habitantes da montanha de Seir, se levantaram contra Judá. Quando avisaram a Josafá desta emboscada contra ele e o seu povo, Josafá apregoou um jejum para todo o povo de Judá e orou ao Senhor. (2 Cr 20.1-13). O Espírito de Deus, então, tomou o profeta Jaaziel, filho de Zacarias e falou a Josafá e a todo o povo que não temessem, pois, naquela peleja eles não precisariam pelejar, pois a peleja era de Deus. (2 Cr 20.14-17).
Há muitas outras passagens bíblicas no Antigo e no Novo Testamento que mostram o jejum sempre acompanhado da oração (Ed 8.21-23; Ne 1.4; 9.1; Lc 2.37; At 13.2,3). O jejum, acompanhado da oração são dois aliados fortes para se obter sucesso na vida espiritual. São armas poderosas na batalha contra as forças do mal. A oração e o jejum são dois elementos indispensáveis para a vitória na batalha espiritual. Em Mateus 17.21, Jesus disse: “Esta casta de demônios não se expulsa senão pela oração e pelo jejum.” Entretanto, não devem ser tratados como “atos mágicos”, “milagrosos” ou místicos. A oração e o jejum servem para quebrantar o nosso coração e submeter-nos a Cristo. É dele que vem a nossa vitória. Jejum e oração sem arrependimento, fé e submissão a Deus não passam de religiosidade vazia.
2- O aspecto bíblico sobre o jejum. O jejum bíblico é diferente daqueles praticados em outras religiões. A prática do jejum, em geral, consiste na abstinência de alimentos. A fome prolongada pode causar visões ou delírios. Em vista destes fenômenos, muitas religiões pagãs usam a prática do jejum para "facilitar" a comunicação com os espíritos. Do ponto de vista bíblico, no entanto, o jejum está relacionado à humilhação e confissão de pecados (Dt 9.18; Jn 3.5); lamentação por alguma calamidade, ou derrota em uma batalha (Jz 20.26; Ne 1.4; Et 4.3).
A Lei previa um dia anual de jejum, chamado “Dia da expiação”, que os judeus chamam de Yom Kippur (Lv 16.29-34). Depois, foram criados outros tipos de jejum: do nascer ao pôr do sol, de sete dias, três semanas, quarenta dias e até durante o quinto e sétimo mês. Finalmente os rabinos estabeleceram o jejum de duas vezes por semana, que vigorava nos dias de Jesus como um ritual. Isso acabou se tornando uma prática legalista e motivo de auto exaltação, como na parábola do fariseu e do publicano. Foi exatamente isso que Jesus combateu no Sermão do Monte.
3- O ensino de Jesus sobre o jejum. Os ensinos de Jesus sobre o jejum não são abundantes. O mestre limitou-se a dar algumas orientações, sobre as motivações que levam as pessoas ao jejum. Nos temas da oração, da ajuda aos necessitados, da vigilância e outros, Jesus ordenou diretamente aos seus discípulos que eles deveriam fazer isso. Mas não há uma ordem, nem mesmo um pedido para os seus discípulos jejuarem.
Os discípulos de João e os fariseus, chegaram a questionar a Jesus, por que os seus discípulos não jejuavam: Ora, os discípulos de João e os fariseus jejuavam; e foram e disseram-lhe: “Por que jejuam os discípulos de João e os dos fariseus, e não jejuam os teus discípulos?” (Mc 2.18). Jesus respondeu que os filhos das bodas não podem jejuar enquanto o esposo estiver com eles. Mas, quando lhe for tirado o esposo então jejuam.
O fato de Jesus não ter ordenado o jejum aos seus discípulos não significa que Ele não aprova o jejum ou que não precisa ser praticado. Jesus não apenas falou sobre o jejum, como também o praticou. Quando falou sobre o jejum, Jesus não disse “se jejuardes”, Ele disse “quando jejuardes”. Ele partiu do pressuposto de que os seus discípulos jejuariam. Entretanto, Jesus não estipulou um período, um dia, ou motivos para o jejum, como no Judaísmo.
No ensino de Jesus, o jejum deve ser uma prática pessoal, voluntária e discreta, entre o discípulo e Deus. “E, quando jejuardes, não vos mostreis contristados como os hipócritas; porque desfiguram os seus rostos, para que aos homens pareça que jejuam. Em verdade vos digo que já receberam o seu galardão. Porém tu, quando jejuares, unge a tua cabeça, e lava o teu rosto, para não pareceres aos homens que jejuas, mas a teu Pai, que está em oculto; e teu Pai, que vê em oculto, te recompensará.” (Mt 6.16-18).
A conclusão que chegamos neste ensino de Jesus é que o valor do jejum não está na frequência com que se faz. O jejum cristão pode ser feito por tristeza pelo pecado, para estreitar a comunhão com Deus ou buscar uma direção divina diante de alguma situação. O importante é que o jejum não pode ser praticado com motivações carnais e egoístas, ou para tentar forçar Deus a fazer alguma coisa. Também não é uma forma masoquista de punir o próprio corpo, ou alguma forma de ascetismo, que defende a abstinência de alimentos ou prazeres para o desenvolvimento espiritual. O jejum cristão é uma abstinência voluntária de alimentos por um período, com o objetivo de aumentar o autocontrole e sujeitar o nosso corpo ao espírito, para nos dedicar às coisas espirituais.
REFERÊNCIAS:
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BRANDT, Robert L. e BICKET, Zenas J. Teologia Bíblica da Oração. Editora CPAD. pag. 208-209.
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CHAVDA, Mahesh. O poder secreto da oração e do jejum: liberando o poder da igreja que ora. Editora Vida 3ª reimp. 2011. pág. 119-122.
STOTT, John. Contracultura cristã. A mensagem do Sermão do Monte. Editora: ABU, 1981, pag. 63-65.
LOPES, Hernandes Dias. Mateus Jesus, O Rei dos reis. Editora Hagnos. pág. 220-222.
RICHARDS, Lawrence O. Comentário Histórico-Cultural do Novo Testamento. Rio de Janeiro: CPAD, 2012, p.32.
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Pb. Weliano Pires